Textos #4 - Outro poema...

Posted: sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
O poema a seguir foi escrito em maio de 2007, para a mesma destinatária do poema desse post.


Sem rumo


Teu olhar me desnorteia
Teu sorriso me derrete
Teu falar me desconcentra
Teu andar me desconcerta

Tua presença me alegra
Tua ausência me entristece
Tua chegada me anima
Tua partida me deprime

Teu perfume me inebria
Tua boca me convida
Tua alva pele me atrai
Teu jeito me maravilha

Tua existência me completa
Eu não sei o que faria
Caso tu não existisses
Eu ficaria sem rumo

Notas #7 - O mais novo supergrupo

Posted: quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Supergrupo é uma designação que surgiu no mundo do rock na década de 1960, para "grupos musicais cujos membros já haviam alcançado previamente fama e respeito no cenário musical, com outras bandas ou em carreira solo". No artigo sobre "supergrupo" na Wikipedia (de onde tirei a definição...), há uma lista com dezenas deles. Exemplos recentes são o Audioslave e o Velvet Revolver, ambos de hard rock e já desfeitos. Pois em 2009 surge o mais novo supergrupo, dessa vez de power pop: Tinted Windows. Formado por Taylor Hanson (Hanson) nos vocais, James Iha (Smashing Pumpkins) na guitarra, Adam Schlesinger (Fountains of Wayne) no baixo e Bun E. Carlos (do lendário Cheap Trick) na bateria, o grupo promete lançar seu álbum de estreia dia 21 de abril. Já tem site oficial, página no MySpace, breve perfil no site da revista Rolling Stone...nos três, é possível ouvir a primeira música deles, "Kind of a Girl". É boa, mas nada de excepcional: lembra coisas do chamado "Disney rock", como Jonas Brothers (isso indica que algo do "Disney rock" é bom, e não que Tinted Windows é ruim), e além disso, só o Hanson sozinho tem umas 10 ou 15 músicas melhores que essa. Sem falar quase que na discografia toda do Cheap Trick, hehehe...

Cenas musicais #4 - "Way Back Into Love" em "Letra e Música"

Posted: terça-feira, 24 de fevereiro de 2009
"Letra e Música" (2007) é uma comédia romântica água com açúcar, com dois dos maiores astros do gênero, juntos pela primeira vez: Hugh Grant e Drew Barrymore. Com certeza, é a minha comédia romântica preferida, de longe: a química entre o casal é perfeita, os personagens coadjuvantes são excelentes, as interpretações de todos estão na medida, e o principal, o filme mistura música e cinema! Há diversas citações ao pop, principalmente dos anos 80 (o clipe da banda fictícia da personagem de Grant, PoP! - PoP! Goes My Heart, é das coisas mais hilárias dos últimos tempos), mas também ao pop atual, como na cena em que a personagem de Barrymore critica a mistureba feita atualmente.

No filme, os dois acabam ficando encarregados de compor uma canção. A música em questão acaba por se chamar "Way Back Into Love". Essa música foi, na verdade, composta por Adam Schlesinger, baixista da banda americana de rock alternativo/power pop Fountains of Wayne. Adam já participou da trilha de diversos filmes além desse, sendo o caso mais notável, pelo qual foi indicado ao Oscar de melhor canção original, em 1997, a música "That Thing You Do!", do filme "
The Wonders: O Sonho Não Acabou". Em "Letra e Música", "Way Back Into Love" aparece duas vezes: numa versão "demo", feita no estúdio caseiro da personagem de Grant, com Barrymore cantando ao seu lado (é a cena que destaco abaixo), e no final, em versão "definitiva", cantada por Grant e pela cantora para a qual eles compuseram a canção (veja a cena aqui).

Para baixar ambas versões da música completas, clique aqui.


Oscar #3 - Vencedores 2009

Posted:
No domingo, 22/02, ocorreu a 81ª entrega dos prêmios Oscars dados pela Academia. Como disse nesse post, Kate Winslet realmente se sagrou campeã na categoria melhor atriz. Além dessa mega-adivinhação, também postei quem acharia que sairia vencedor em todas as 24 catregorias, e disse que garantia mais de 10 acertos. Fiz uma promessa conservadora, e a cumpri: acertei 14 dos vencedores. Até que fui meio mal, considerando que praticamente todos os favoritos venceram, sendo que a maioria repetiu a vitória que obteve no seu respectivo sindicato ou associação (ex.: a fotografia de "Quem Quer Ser um Milionário?" venceu o prêmio da Associação Americana dos Fotógrafos, em tradução minha). Apenas lembro que quando fiz minha aposta só havia ocorrido o Globo de Ouro de toda a temporada de premiações (incluindo a dos sindicatos/associações); se tivesse apostado no sábado, dia 21/02, teria cravado 18 acertos, acreditem ou não...

A lista dos vencedores, abaixo:


Melhor filme

Quem Quer Ser um Milionário?

Melhor diretor
Danny Boyle (Quem Quer Ser um Milionário?)

Melhor atriz
Kate Winslet (O Leitor)

Melhor ator
Sean Penn (”Milk - A Voz da Igualdade”)

Melhor atriz coadjuvante
Penelope Cruz (Vicky Cristina Barcelona)

Melhor ator coadjuvante
Heath Ledger (Batman - O Cavaleiro das Trevas)

Melhor roteiro original
Milk - A Voz da Igualdade

Melhor roteiro adaptado
Quem Quer Ser um Milionário?

Melhor filme em língua estrangeira
“Departures” (Japão)

Melhor animação
Wall-E

Melhor curta de animação
La Maison en Petits Cubes, de Kunio Kato

Melhor documentário
Man on Wire, de James Marsh e Simon Chinn

Melhor documentário em curta-metragem
“Smile Pinki” (Megan Mylan)

Melhor trilha sonora original
A. R. Rahman (Quem Quer Ser um Milionário?)

Melhor canção original
“Quem Quer Ser um Milionário?” (”Jai Ho”)

Melhor direção de arte
“O Curioso Caso de Benjamin Button” (Donald Graham Burt e Victor J. Zolfo)

Melhor fotografia
“Quem Quer Ser um Milionário?” (Anthony Dod Mantle)

Melhor edição
“Quem Quer Ser um Milionário?” (Chris Dickens)

Melhor mixagem de som
“Quem Quer Ser um Milionário?” (Ian Tapp, Richard Pryke e Resul Pookutty)

Melhor edição de som
Batman - O Cavaleiro das Trevas (Richard King)

Melhores efeitos especiais
O Curioso Caso de Benjamin Button (Eric Barba, Steve Preeg, Burt Dalton e Craig Barron)

Melhor maquiagem
O Curioso Caso de Benjamin Button (Greg Cannom)

Melhor figurino
“A Duquesa”

Melhor curta-metragem
“Spielzeugland” (Toyland) - Jochen Alexander Freydank

Filmes no cinema #7 - "O Lutador"

Posted: sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009


Nota: 8,0


Mickey Rourke e Darren Aronofsky. Esses dois homens são a base insubstituível de "O Lutador"; o resto pode perfeitamente ser trocado sem comprometimento. Mas seu ator principal e diretor são o filme. O trabalho dos dois se sobressai de tal modo que o filme simplesmente não existiria se não fosse a presença dos dois.

Mickey é Randy 'The Ram' Robinson ("The Ram" = carneiro), um lutador de boxe que viveu seus dias de glória nos anos 80, e que atualmente encontra-se em total decadência: durante a semana, trabalha num supermercado, nas mais variadas funções, desde carregador de caixas a atendente no balcão de frios. Nos finais de semana, participa de eventos de luta livre, nos quais é sempre a estrela principal. Tais eventos rendem apenas algum pouco dinheiro para ele, e a sensação de estar de volta ao passado: as lutas são de exibição; os golpes, mesmo que de verdade, são todos combinados previamente nos bastidores. Randy é um homem solitário: vive num trailer, tem uma filha que o odeia (Evan Rachel Wood) e a única mulher presente em sua vida é a stripper Cassidy (Marisa Tomei, no esplendor da forma física aos 44 anos), que já é chamada de mãe por alguns dos jovens que frequentam o local onde trabalha.

Eis que então ocorre uma reviravolta: certo dia, logo após uma dessas lutas de fim de semana, ele sofre um infarto. Causado pela idade, pelo esforço que ele fazia mas, principalmente, pelo uso intenso de anabolizantes que ele fazia, isso causa um impacto em sua vida: o médico diz que ele nunca mais poderia lutar. O problema disso é que, segundo o próprio Randy no filme, é só isso que ele sabe fazer... No entanto, tenta obedecer a ordem médica (em grande parte por causa de uma cena na qual está num evento cheio de veteranos como ele, e vê o estado deplorável no qual os outros se encontram, e decide que não quer isso para ele), e busca apoio em Cassidy e na sua filha: começa a se construir uma óbvia relação de amor entre Randy e Cassidy, e sua filha e ele começam uma reconciliação.

Porém, Randy mostra porque entrou em decadência ao estragar tudo que começou a reconstruir com a filha, e não aguenta mais ficar longe das lutas, e decide aceitar a proposta de uma revanche de sua mais memorável luta, 20 anos depois, mesmo sabendo dos riscos que corre. Assim, chega-se ao magistral clímax do filme: a entrada triunfal de Randy ao som de "Sweet Child O' Mine", com a bandeira dos EUA ao fundo (mais anos 80, época de ouro do lutador, impossível!), o discurso antes da luta começar de Randy/Mickey Rourke (cena que vale o ingresso e todos os elogios e prêmios à Rourke) e o sensacional final com o "Golpe final do Carneiro", que é como Randy termina todas as suas lutas durante a projeção.

O filme, apesar de ser extremamente clichê, por mostrar o típico perdedor que quer se reerguer, mas tem dificuldades, além de ter roteiro excessivamente linear, com personagens previsíveis como Cassidy, consegue ser muito bom graças à Rourke e Aronofsky: o ator está simplesmente perfeito, e o diretor idem. Mickey Rourke já tem 56 anos, e foi uma grande revelação de Hollywood nos anos 80, mas deixou se deslumbrar pelo sucesso, acabou se afundando em drogas, virou ele próprio um lutador, que deixaram visíveis marcas em seu rosto e corpo, mesmo após cirurgias plásticas. Logo, Randy é praticamente um auto-retrato seu. Aronofsky faz aqui seu primeiro filme mais, digamos, comum, depois de filmes como "Pi", "Réquiem para um Sonho" e "Fonte da Vida". Além de um estilo de filmagem que sempre "segue" a personagem, com a câmera sempre mostrando as costas e, consequentemente, o seu ângulo de visão da situação, o diretor consegue fazer uma história que tinha tudo para ser melodramática e piegas ser algo que vale a pena ser visto. A cena que destaco é a de Randy indo para o balcão do supermercado, enquanto no fundo ouve (ouvimos) gritos da plateia, como se estivesse prestes a entrar num ringue. Fantástico.

Como está na matéria de Isabela Boscov na Revista Veja da semana passada: "Aronofsky contratou Rourke com uma bronca de franqueza brutal. Enfiou o dedo na cara do ator, disse que ele virara uma piada, que estava correndo um risco insensato porque não conseguia levantar um tostão de financiamento assim que o nome dele era mencionado, e avisou que exigiria obediência e dedicação incondicionais. Como não há nada que Rourke respeite mais do que uma demonstração de valentia, o acordo foi firmado."
"Entre o ‘ação’ e o ‘corta’, não existe um ator mais imenso no mundo. O difícil é levar Mickey até lá. Depois de duas tomadas, ele já está perguntando se não pode ir para casa. O caso é que essas duas tomadas são ótimas – mas as que vêm depois são magníficas. Mickey é um ator que precisa ser inspirado e pressionado, porque é um preguiçoso", brinca, mas não muito, Aronofsky." Ou seja, o diretor foi o responsável por fazer Rourke renascer das cinzas. E as chances dele levar o Oscar 2009 de melhor ator por esse filme são imensas.

Outra coisa que faz o filme ser muito bom é sua trilha sonora: já falei algumas vezes por aqui sobre metal farofa, glam metal e essas coisas, e só há músicas desse gênero no filme! Para quem curte, como eu, o filme é um prato cheio! Bandas como Cinderella, Ratt e Firehouse marcam presença em muitos momentos. Os ídolos de Randy são os Guns N' Roses! Guns que estão ligados ao filme de maneira intensa: Slash é quem toca as guitarras na trilha sonora instrumental do filme, composta por Clint Mansell, velho colaborador de Aronofsky; quem ficar até o final dos créditos verá que a última frase que aparece na tela é algo como "o elenco e a equipe do filme gostariam de agradecer especialmente à Axl Rose". Por quê? Aronofsky explica: "Bem, nós tocamos 'Sweet Child O' Mine' umas trezentas ou quatrocentas vezes durante as filmagens. Mickey é muito amigo de Axl, e Axl foi essencial para nos garantir 'Sweet Child O' Mine' para o clímax do filme.". Por fim, o melhor diálogo do filme está relacionado à banda (em tradução livre minha, veja o original aqui):

Randy: - Caramba, eles não as fazem mais como faziam antes.
Cassidy: - Os anos 80 foram foda, a melhor porra que já teve!
Randy: - Isso! Guns N' Roses! Eles são o máximo!
Cassidy: - Crue! (Mötley Crue)
Randy: - Yeah!
Cassidy - Def Lep! (Def Leppard)
Randy: - Aí, aquela bicha do Cobain teve que aparecer e estragar tudo.
Cassidy: - Como se houvesse algo errado, por que não se divertir, apenas?
Randy: - Vou te dizer, eu odeio a porra dos anos 90.

Já falei algo sobre o assunto no post sobre o Bon Jovi, mas o fato é que a chegada do Nirvana, de Kurt Cobain, varreu do mapa todas as bandas de metal farofa que existiam no planeta, por isso a revolta. Para Randy, em especial, essas bandas trazem à tona as memórias do seu auge como lutador, e os anos 90 foram sua derrocada.

Para saber mais sobre a famosíssima rivalidade entre Axl Rose e Kurt Cobain, que rendeu momentos surreais durante o VMA de 1992, leia esse texto em português, ou esse, de Krist Novoselic, baixista do Nirvana.

Notas #6 - Rock 'n' Roll "rima" com futebol!

Posted: terça-feira, 17 de fevereiro de 2009
Está certo, a rima é meio forçada, mas não há como negar que rock e futebol tem tudo a ver. Principalmente no Brasil, óbvio, por estarmos no país do futebol, mas no mundo todo essa relação é notória.

Começo falando sobre o campeonato que a MTV brasileira criou em 1995, que reunia os músicos das principais bandas roqueiras do país para disputar peladas entre si: o Rockgol. No começo, era algo beeeem tosco. A célebre cena que retrata essa fase é a do Peninha, do Barão Vermelho, perdendo sua dentadura (!). Nas duas primeiras edições, podiam participar também ex-jogadores veteranos e roadies. Depois, tudo foi crescendo, ficando melhor estruturado: só foi permitida a participação de músicos, o campeonato foi sendo organizado em grupos, o "estádio" foi melhorando. No entanto, a decadência começa em 2000, quando a MTV tentou se popularizar, e isso resultou no convite para bandas como Os Morenos, Só Pra Contrariar e a dupla Claudinho & Buchecha para participar do evento. Mais peladeiros que os roqueiros, venceram os campeonatos. A MTV desistiu de se popularizar: não chamou mais pagodeiros. Só que aí as bandas principais do país já haviam abandonado o Rockgol, tendo sobrado apenas as do segundo escalão pra baixo, como Tihuana, Comunidade Nin-Jitsu e o Natiruts. Ainda assim, o campeonato continuou interessante, por ser bizarro e engraçado, graças às narrações de Paulo Bonfá e os comentários de Marco Bianchi, ex-integrantes do trio de humor Os Sobrinhos do Ataíde, que ficou no ar em São Paulo na antiga 89FM - A Rádio Rock nos anos 90. Eles, além de narrarem com humor, criaram personagens que ninguém esquece como Ovelha, Seo Ronaldão e Chiliquenta. A partir de 2005, porém, o campeonato foi se tornando repetitivo, sempre com as mesmas piadas. Em 2007, se renovou, mas para pior: entraram as bandas emo! NXZero, Fresno, Forfun...Todas essas porcarias que os adolescentes brasileiros hoje curtem. Perdeu a graça, acabaram as bandas relevantes do rock nacional, fim dos personagens - ok, pode ser que eu tenha ficado velho demais para isso... =).

O Rockgol, além de momentos engraçados e audiência para a MTV, gerou uma das parcerias mais importantes do rock brasileiro dos anos 90 até hoje: Samuel Rosa, do Skank, e Nando Reis, ex-Titãs, se conheceram numa dessas competições, mais precisamente no ano de 1995. No calor da disputa de uma partida, acabaram tendo a ideia de compor uma música sobre futebol, juntos. Samuel é ótimo compositor de melodias (bom guitarrista e razoável vocalista), e Nando é ótimo letrista. Juntaram suas habilidades e fizeram "É Uma Partida de Futebol", que ainda é massivamente tocada e é quase unanimidade quando se pensa em futebol e rock ao mesmo tempo. A parceria deu tão certo que dura até os dias atuais: passou pela primeira sinalização de mudança do Skank, "Resposta", continuou em "Ali", "Dois Rios" e "Eu e a Felicidade", entre outras dos discos subsequentes do Skank, e chegou ao penúltimo single da banda, "Ainda Gosto Dela", e gerará ainda muitos sucessos, como por exemplo o que acho que será a próxima música do Skank a estourar nas paradas: "Sutilmente".

No mundo todo, o rock se confunde com o futebol: em 2003, a música "Seven Nation Army", do duo White Stripes (mais especificamente seu marcante riff de guitarra, que é quase um refrão instrumental), foi cantada pela primeira vez num estádio de futebol no jogo FC Bruges e AC Milan, pela Liga dos Campeões da UEFA. Depois, no jogo entre AS Roma e Club Brugge, pela Copa da UEFA, os romanos entoaram mais uma vez a canção. Ela só se popularizou planetariamente em 2006, quando os italianos a usaram na comemoração de seu tetracampeonato na Copa do Mundo, cantando "Campioni del Mondo" em cima do riff. Depois, virou hino não-oficial da Eurocopa de 2008, sendo utilizada por torcidas de toda a Europa para incentivar seus times: alemães, espanhóis , suecos... Rapidamente, a música começou a se espalhar por diversos estádios: a torcida do Liverpool canta "Javier Mascherano" em cima do riff; a do Chelsea, "Juliano Belletti"; a do Porto, "Mariano González". Torcedores do australiano Melbourne Victory entoam o riff sempre depois que a equipe faz um gol...Procurando pelo YouTube, é capaz de achar mais exemplos. Até no Brasil essa onda chegou: "Seven Nation Army" ganhou paródia da torcida do Internacional de Porto Alegre.

Agora, o pior da junção de rock e futebol ocorre quando há a homenagem dos pais a seus ídolos. Isso acontece na hora do batismo de seus rebentos, que se tornam conhecidos como jogadores e expõem nomes absurdos como Keirrison, atual atacante do Palmeiras, que segundo o próprio em entrevista à Veja São Paulo dessa semana, falou que seu pai gosta muito da letra K e de rock, e resolveu homenagear...George Harrison, ex-guitarrista dos Beatles!! Keirrison ainda tem um irmão chamado Kimarrison (a letra favorita do pai + Jim Morrison, ex-líder do The Doors). Outro caso que ficou muito famoso há alguns anos foi o de uma jovem revelação do Guarani na época, hoje com 29 anos e no Santa Cruz. Ele se chama simplesmente...Creedence Clearwater Couto! Tudo porque seu pai era muito fã da banda Creedence Clearwater Revival. Já ouviram falar também no jogador Odvan, que jogou muitos anos no Vasco, não? Seu nome é derivado de uma música do Roberto Carlos que sua mãe gostava muito, chamada..."O Divã"!!! Ah, e para quem reclamar que "O Rei" não é rock: no final dos anos 50, ele já foi chamado por Carlos Imperial de "Elvis Presley brasileiro", e cantava sucessos como "Tutti Frutti", "Teddy Bear" e outros mais, viu?


UPDATE: acabei de descobrir que há uma banda de Manchester, Inglaterra, que se chama...Vagner Love!! Incrível... Para saber muito mais sobre eles, e até o que o atacante do CSKA Moscou, revelado pelo Palmeiras, acha disso, clique aqui. Para ouvir algumas músicas do grupo, que diz ser uma mistura de Teenage Fanclub com Oasis (já falei de ambos no blog...!), vá ao MySpace deles.

Aviso...

Posted: domingo, 15 de fevereiro de 2009
Excepcionalmente, tanto nessa semana quanto na próxima, no domingo de carnaval, não serão publicados os posts de "artistas da semana". Os próximos serão conhecidos apenas no dia 1º de março. Mas o blog não para!!! Continuem passando por aqui, praticamente todos os dias publicarei algo novo!

Cenas musicais #3 - "Flame Trees" em "Sob o Efeito da Água"

Posted: sábado, 14 de fevereiro de 2009
"Sob o Efeito da Água" é um filme australiano de 2005, muito premiado no seu país de origem. Sua protagonista é uma das grandes atrizes da atualidade de Hollywood, mesmo sendo nascida na Austrália: Cate Blanchett. Ela faz o papel de uma trintona que tenta se recuperar de um vício em drogas. Mora com sua problemática - que durante o filme vai ganhando contornos de trágica - família, de classe média baixa, num subúrbio australiano e passa os dias entre sua casa e o trabalho, com os únicos momentos de prazer dedicados à natação. Hugo Weaving, o agente Smith de Matrix, aqui é o melhor amigo da personagem de Cate. Ele é uma ex-estrela do futebol que se afundou no vício, e foi o responsável por a introduzir no mundo das drogas. O filme é duro, pesado e implacável, mas extremamente bem feito e que mostra que a Austrália não é aquela maravilha que todos pensam: lá também tem traficantes, crimes, sordidez, etc.

Além da dura crueza das suas verdades, o filme tem duas belíssimas cenas, todas embaladas por uma música que eu desconhecia. Aí, ficando sozinho até o fim da sessão, com o pessoal da limpeza do cinema esperando eu sair para poder entrar, li os créditos e descobri que a música se chama "Flame Trees", e que é de 1984. Chegando em casa, busquei na internet tal canção, e descobri que ela é da banda australiana de
hard rock/rock 'n' roll Cold Chisel - nunca tinha ouvido falar... Bem, tal banda ficou em atividade entre 1973 e 1984, tendo voltado brevemente em 1998 para fazer uma música e depois em 2003 para uma turnê chamada "Ringside". Seus maiores hits (aliás, melhores músicas, aquelas que realmente valem a pena serem ouvidas) são "Flame Trees", "Khe Sahn", "Saturday Night", "Choir Girl" e "Bow River". A marcante voz do vocalista, Jimmy Barnes, me lembra bastante a de John Fogerty, do Creedence Clearwater Revival.

Porém, no filme não é ouvida a versão original da música: numa das cenas, a mais emocionante, ouve-se o coral infantil da
The Sacred Heart School, da cidade de Cabramatta, numa versão bem diferente, mas até melhor que a do Cold Chisel. Na cena final, ouve-se a cantora Sarah Blasko fazendo uma versão que no filme soa adequada, mas que fica extremamente chata se ouvida isoladamente...

Abaixo, a cena na qual o coral das crianças canta, e ainda um link para baixar 5 versões de "Flame Trees": além das 3 citadas no texto, uma tocada ao vivo durante a turnê "Ringside", e outra uma linda versão acústica lançada em 1994 no disco "Flesh and Wood", de Jimmy Barnes.





Download das músicas: http://www.4shared.com/dir/12019730/b549225a/Flame_Trees.html

Artista famoso - Alanis Morissette; Artista "desconhecido" - The Corrs

Posted: domingo, 8 de fevereiro de 2009
Alanis Nadine Morissette é uma cantora e compositora canadense, nascida em Ottawa no dia 01 de junho de 1974, que já ganhou 7 Grammys e 12 Juno Awards (premiação para a música do Canadá). Começou a carreira mais cedo do que a maioria sabe, e, ao contrário do que a maioria pode pensar, ainda não a encerrou...

Aos 6 anos de idade, Alanis começou a ter aulas de piano. Aos 7, já sabia tocar o instrumento, bem como dançar balé, e manifestava seu talento para as artes. Aos 9 anos, Morissette compôs sua primeira música, "Fate Stay with Me", que foi mandada para uma cantora de folk local, Lindsay Morgan, que adotou Alanis como sua protegida. Morissette lançou a canção como um single por um selo fundado por ela e Morgan. Em 1986, ela estava no elenco do programa da CTV/Nickelodeon, You Can't Do That on Television.

Em 1988, assinou contrato com a gravadora MCA Records, pela qual, em 1991 (aos 16/17 anos, portanto), lançou seu primeiro álbum de estúdio, Alanis. Com todas as músicas compostas por ela e seu produtor, Leslie Howe, o disco foi lançado apenas no Canadá, onde vendeu 200.000 cópias, sendo um sucesso: ela chegou a abrir shows de Vanilla Ice! Foi indicada a 3 Juno Awards, saindo vencedora na categoria "revelação"; os outros dois que ela perdeu são referentes à canção hit do álbum, "Too Hot" ("single do ano" e "melhor gravação dance"). É um álbum de dance-pop, algo bem diferente do que ela viria a fazer no restante de sua carreira.

Em 1992, sai seu segundo álbum de estúdio, Now Is The Time. Mais uma vez, o disco foi lançado apenas no Canadá, mas não obteve o sucesso de seu antecessor: vendeu apenas 50.000 cópias. Com músicas que já não eram mais tão dance assim, já começava a esboçar a brusca mudança que ocorreria e a faria conhecida no mundo todo. Após cumprir o contrato de 2 discos com sua gravadora e com o insucesso de seu disco, ela foi dispensada. Mas lembre-se, Alanis ainda é jovem: no fim do ano, se formou no ensino médio...

Em 1993, muda-se de Ottawa para Toronto, onde começa a viver sozinha pela primeira vez na vida. Faz também viagens regulares a Los Angeles, nos EUA, para procurar músicos para colaborar com ela. Então, conhece Glen Ballard, um produtor e compositor. Alanis e Ballard rapidamente se identificam e começam a compor juntos o que viria a se tornar, em 1995, Jagged Little Pill - cuja tradução para o português é "aquele risquinho que existe no meio das pílulas". O álbum saiu pela gravadora Maverick Records, da qual Madonna é uma das fundadoras. Vendeu nada menos que 30 milhões de cópias pelo mundo todo (metade disso nos EUA), foi indicado a 8 Grammys entre 1996 e 1997 (dos quais ganhou 4, em 1996 - "melhor performance de rock feminina", "melhor composição de rock" ,"melhor álbum de rock" e "álbum do ano"), 9 Juno Awards (ganhou 8) e fez de Alanis a maior estrela do rock mundial, aos 21 anos.

O primeiro single já foi uma porrada: "You Oughta Know", com a participação do então guitarrista do Red Hot Chili Peppers Dave Navarro e do inconfundível baixista da banda até hoje, Flea, a letra e música da canção expõem toda a raiva da cantora contra um ex-namorado seu, que a trocou por outra, de forma bastante explícita (em trechos como "ela faria um boq**** em você num cinema?" ou ainda "você pensa em mim quando f**e ela?"). Depois desse, seguiram-se outros singles de sucesso enorme, como "Hand In My Pocket" e suas antíteses, "Ironic" - cujo clipe ganhou duas versões, uma com a Alanis mesmo, outra com uma "cover infantil" dela, o qual não achei na internet...=(- e sua explosão inesquecível no refrão, a mais alegre "You Learn" e a cheia de gaita "Head Over Feet", com o marcante clipe "a cara da Alanis". Marcado por muito desabafo, de certa forma comum à jovens de sua idade, Morissette rapidamente achou ouvidos que se identificaram com ela, e virou fenômeno. Tanto que ela foi precursora de inúmeras cantoras de rock que vieram depois dela, como por exemplo Pink e Avril Lavigne, além de ter aberto portas para outras cantoras que não especificamente de rock, como a Shakira (no começo, era mais música e menos dança-espetáculo, lembrem-se). Seguiu-se uma exaustiva turnê, na qual seu baterista era Taylor Hawkins, que mais tarde se juntaria ao Foo Fighters.

O documentário sobre a turnê, Jagged Little Pill, Live, rendeu à Alanis mais um Grammy, em 1998, na categoria "melhor longa metragem". Devido ao sucesso tremendo, Alanis foi convidada para compor uma música para a trilha sonora de um dos filmes mais tristes que conheço ("Cidade dos Anjos", de 1998): "Uninvited". A canção nunca foi lançada como single, nem em nenhum álbum da cantora, mas é até hoje um de seus grandes hits. Ganhou dois Grammy em 1999: "melhor performance de rock feminina" e "melhor composição de rock".

Acabada, Alanis vai tirar umas férias na Índia, onde acaba por passar também por uma espécie de "retiro espiritual". Eis então que, em 1998, depois de ficar mais zen, a cantora lança Supposed Former Infatuation Junkie disco menos simples que o anterior, mas mesmo assim muito bom: músicas longas, muitas sem refrão, com boas melodias e letras. Há mais variação no estilo das músicas, temos desde mais pesadas como "Baba" e "So Pure", até músicas bem mais calmas, que refletem sua nova fase, como "That I Would Be Good" e o único grande sucesso mundial que saiu desse disco, "Thank U". O álbum vendeu 11 milhões de discos, mas tirou Alanis do topo, como era inevitável, aliás.

Em 1999, decide gravar um precoce Acústico MTV, no qual obviamente só constam músicas a partir de Jagged Little Pill. O disco tem 12 canções, sendo 4 de cada um dos dois álbuns (contando "Uninvited" como sendo de Supposed, por ser da mesma época) e mais 4 gravações inéditas, sendo que coloquei duas na minha seleção: a melhor das novas, "Princes Familiar", e outra que é uma cover da banda de Sting, The Police, "King Of Pain" (ouça a original). Alanis Morissette começa a ficar irrelevante no mundo da música.

Depois de três anos sumida, reaparece em 2002, com o disco Under Rug Swept. Pela primeira vez, Alanis conpunha todas as canções sozinha e ainda era produtora de um álbum. A crítica recebeu-o de forma irregular: uns gostaram, outros não. Eu não gosto, acho um disco bem chatinho, com letras ruins e melodias repetitivas. No entanto, acho que "Hands Clean" é a música mais legal que a cantora já fez na sua carreira, e "Precious Illusions" também é boazinha, figurando na minha seleção. O disco vendeu muito bem, obrigado - 7 milhões de cópias -, mas principalmente graças a fãs antigos do que a novos.

No mesmo ano de 2002, saiu um pacote CD/DVD chamado Feast on Scraps. O CD tinha apenas lados-B dos singles de Under Rug Swept, ou então músicas que ficaram de fora do disco. O destaque fica por conta da bela "Offer", que fez muito sucesso no Brasil graças à sua inclusão na trilha sonora da novela "Celebridade". O DVD contém um show da cantora, com seus maiores sucessos.

Em 2004, sai o disco So-Called Chaos, uma tentativa de volta ao passado, isto é, músicas mais simples e diretas, com uma pegada mais roqueira do que vínhamos ouvindo. O resultado é um disco razoável até, com músicas boas como "Eight Easy Steps" e a densa balada "Everything". Acontece que, se posto lado a lado com Jagged Little Pill, o disco perde de goleada. Como a comparação é inevitável, Alanis Morissette passa ao quase ostracismo com esse disco, virando praticamente uma ex-artista que canta seus sucessos do passado...

Confirmando o que eu falei acima, em 2005 ela lança Jagged Little Pill Acoustic, com todas as músicas do disco de 1995 gravado em versões acústicas, para comemorar seu décimo aniversário de lançamento. Vendeu 1 milhão de cópias. No mesmo ano, sai a coletânea The Collection, cuja novidade é o cover "Crazy", originalmente de Seal, feito para a trilha sonora do filme "De-Lovely - Vida e Amores de Cole Porter". Vendeu 1 milhão de cópias. Ainda em 2005, Alanis compõe a canção "Wunderkind" para a trilha sonora do filme "As Crónicas de Nárnia - O Leão, a Bruxa e o Guarda-Roupa", que lhe rendeu uma indicação para o Globo de Ouro.

Some da mídia após isso. Reaparece numa brincadeira de 1º de abril em 2007, ao apresentar no YouTube uma versão debochada e irônica para a música "My Humps", do Black Eyed Peas de Fergie. Então, em meados de 2008, lança Flavors of Entanglement, álbum no qual volta a fazer o que fez em Under Rug Swept, porém com um pouco mais de experimentalismo eletrônico. Claro, tem hits que grudam na primeira ouvida ("Underneath") e uma música que é só piano e voz ("Not as We"), mas ainda assim é chatinho que nem o outro. Até agora, o disco conseguiu vender 1 milhão de cópias.

Ela já veio ao Brasil diversas vezes, sendo a primeira delas em 1996, e a última na semana passada. Em 2009, ela fez 11 shows por aqui, sendo que a turnê passou por cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, mas também Teresina e Manaus. Que me perdoem os moradores dessas cidades, mas só artistas internacionais decadentes vão fazer shows lá. Ah, e os melhores momentos dos shows ocorreram quando ela cantou as músicas de Jagged Little Pill...


CD
1- You Oughta Know
2- Hand In My Pocket
3- You Learn
4- Head Over Feet
5- Ironic
6- Uninvited
7- Thank U
8- That I Would Be Good
9- So Pure
10- Joining You
11- Princes Familiar
12- King Of Pain
13- Hands Clean
14- Precious Illusions
15- Offer
16- Eight Easy Steps
17- Everything
18- Underneath
19- Not as We



O The Corrs é uma banda da Irlanda que mistura o tradicional folk rock celta com o pop mais comum que conhecemos. É formada por quatro intregrantes, três mulheres e um homem, todos irmãos: Andrea Jane Corr (vocal e flauta irlandesa), Sharon Helga Corr (segunda voz e violino), Caroline Georgine Corr (segunda voz, bateria, piano e bodhrán (instrumento de percussão irlandês)) e James Steven Ignatious Corr (segunda voz (em algumas canções), guitarra, piano e acordeon). Além dos seus instrumentos habituais, todos sabem tocar piano por meio de aulas dadas por seu pai.


Sua primeira apresentação de sucesso foi no The Late Late Show, na época apresentado por Gay Byrne, em 1993, executando a canção "Runaway" (que viria a constar do primeiro álbum de estúdio da banda). Apesar disso, eram praticamente desconhecidos fora da Irlanda até 1994, quando o embaixador estadunidense no na Irlanda, Jean Kennedy Smith, convidou o grupo a se apresentar em Boston, na Copa do Mundo de 1994. Depois dessa apresentção na Copa, Jason Flom, vice-diretor e produtor da gravadora Atlantic Records, falou para eles marcarem um encontro com David Foster, um músico canadense, produtor, compositor e arranjador. Os Corrs tocaram para ele e Foster concordou em propor-lhes um contrato com a Atlantic Records. Ficaram por mais cinco meses nos EUA para preparar o álbum de estreia.

Então, perto do fim de 1995, sai o primeiro álbum da banda, Forgiven, Not Forgotten. A já citada "Runaway" é o principal destaque, sem dúvida. Além dela, ainda temos a faixa-título e suas belas harmonias vocais, e a instrumental "Toss The Feathers", a melhor instrumental que a banda já lançou até hoje. Nesse disco, temos seis faixas instrumentais, e todas as que os Corrs fazem são de total influência celta, nada de pop há nelas. O disco não foi um grande sucesso, mas tirou a banda do desconhecimento: em 1996, foram chamados para tocar nas Olimpíadas de Atlanta, e depois disso se juntaram à Céline Dion para fazer os shows de abertura de sua turnê.

Eis então que, em 1997, se juntam a Glen Ballard (é, o mesmo produtor que fez explodir Alanis Morissette, como está escrito linhas acima) e lançam o sensacional Talk On Corners. Começando a deixar suas influências celtas um pouco mais de lado e apostando mais no pop, os Corrs fazem o disco que, simplesmente, foi o mais vendido do Reino Unido no ano de 1998. No entanto, o caminho para chegar lá foi tortuoso: o álbum saiu em outubro de 1997, e os três primeiros singles ("Only When I Sleep", com um forte quê de sensualidade nos vocais de Andrea, "I Never Loved You Anyway" e a graciosa "What Can I Do?") foram sucesso só na Irlanda. Então, em 17 de março de 1998, dia de St. Patrick, ocorreu a virada na carreira deles: um concerto no Royal Albert Hall, televisionado pela BBC, no qual o ex-baterista do Fleetwood Mac, Mick Fleetwood, participou de três canções, incluindo "Dreams", de sua banda original. Essa versão foi o "empurrãozinho pro sucesso" ao The Corrs: lançada pouco tempo depois como single, chegou ao top 10 na Inglaterra, resultou num remix que fez mais sucesso ainda e transformou os Corrs nas novas estrelas da música britânica. Claro, as comparações com o Fleetwood Mac tornaram-se mais insistentes por parte da imprensa, a qual também transformou as três irmãs da banda em musas, ao ponto de ter transformado Andrea num verdadeiro símbolo sexual por lá (ok, ela é bonita mesmo...). Talk On Corners foi relançado incluindo "Dreams" em versão de estúdio e re-relançado novamente depois, incluindo remixes de "What Can I Do?" e "Runaway" - esta, do primeiro disco - que também chegaram ao top 10. Outro single de sucesso foi "So Young", e ainda o álbum tem a bela história de "Queen of Hollywood".

Depois dessa superexposição, partem para um projeto que, de uma maneira ou de outra, apenas iria prolongar mais ainda seu sucesso: um Acústico MTV. Porém, o que poderia ser um fiasco se torna um grande acerto: o acústico do The Corrs é o mais lindo que já foi produzido pela MTV. Não sei se é o melhor, mas com certeza é o mais belo: arranjos de violino perfeitos, vozes e harmonias vocais delicadas, e uma ótima seleção de canções, com algumas surpresas. Há duas inéditas: "Radio", a que eu acho a melhor deles até hoje, com um refrão marcante, e a fofa e que ilustra bem a mistura da música irlandesa com o pop, "At Your Side" (ambas seriam relançadas em versão de estúdio posteriormente, no próximo álbum da banda). Temos também três covers: "Little Wing", cuja original é de Jimi Hendrix, "Old Town", do irlandês Phil Lynott, ex-vocalista do Thin Lizzy, que ganha adorável versão (aqui, a original), e "Everybody Hurts", original do R.E.M., e que faz parte da lista de canções "irregraváveis", pois nunca uma versão chegará aos pés da original, por melhor que seja, como é o caso aqui.

Apesar de todo o sucesso, a banda ainda não havia conseguido um primeiro lugar na parada britânica de singles. Isso viria apenas em 2000, com o lançamento do álbum In Blue. A música a conseguir tal feito foi "Breathless", composta pelos Corrs em parceria com "Mutt" Lange (produtor de In Blue), produtor famoso nos anos 80 por produzir diversas bandas de hard rock como AC/DC e nos anos 90 por produzir Come On Over, álbum de sua mulher, a cantora de country Shania Twain. Outra música boa do álbum que é apenas regular é "All the Love in the World", que seria adotada posteriormente na trilha sonora do filme "Os Queridinhos da América", em 2001. Merece destaque também "No More Cry", composta por Andrea e Caroline para ajudar seu pai a superar a morte da esposa (e mãe dos 4 irmãos da banda) em 1999, enquanto esperava por um transplante de pulmão.

Em 2002, lançam o álbum ao vivo VH1 Presents: The Corrs, Live In Dublin, que conta com as participações de Bono Vox, do U2, e de Ron Wood, dos Rolling Stones. Bono, irlandês mais famoso do mundo da música, ainda estaria presente na vida dos Corrs mais duas vezes: em 2003, Andrea grava para a trilha sonora do filme "Cidade dos Sonhos" a música "Time Enough For Tears", escrita por Bono, Gavin Friday e Maurice Seezer - a canção foi indicada ao Globo de Ouro; em 2004, sai Borrowed Heaven, que tem a participação de Bono na música "When the Stars Go Blue", cuja versão original é do cantor de alt-country/rock Ryan Adams. Borrowed Heaven é um disco tão pop quanto In Blue, mas tem mais canções que são relevantes: desde o curto e direto primeiro single, "Summer Sunshine" - que remete a "Breathless" - passando pela lenta balada "Long Night", uma das músicas mais "calmas" que eles já fizeram, pela legalzinha "Goodbye" e chegando na melhor do disco, "Angel", feita em homenagem à mãe deles, com o refrão mais empolgante de todos.

Em 2005, a banda surpreendeu com Home, um álbum tradicional de música celta celebrando suas origens, com várias canções oriundas do repertório de sua mãe, que era cantora: a instrumental "Haste to the Wedding" e as belíssimas "Black Is The Colour" e "Heart Like a Wheel". Desde então, deram uma sumida, para cuidar de suas vidas pessoais. Em 2007, Andrea Corr ainda lançou um disco solo, Ten Feet High, no qual foge um pouco do que sua banda faz, mas não tanto assim a ponto de conquistar novos fãs: é pop-rock básico.


CD
1- Forgiven Not Forgotten
2- Runaway
3- Toss the Feathers
4- Only When I Sleep
5- Dreams
6- What Can I Do?
7- So Young
8- Queen Of Hollywood
9- Radio
10- At Your Side
11- Old Town
12- Breathless
13- All the Love in the World
14- Summer Sunshine
15- Angel
16- Long Night
17- Goodbye
18- Black Is The Colour
19- Heart Like a Wheel
20- Haste to the Wedding

Filmes no cinema #6 - "Dúvida"

Posted: sábado, 7 de fevereiro de 2009

Nota: 7,5


O filme "Dúvida", dirigido por John Patrick Shanley, é baseado na peça "Doubt: A Parable", de 2004. A peça foi escrita por John Patrick Shanley, e o roteiro adaptado para o cinema também. Ficou em cartaz num teatro do circuito off-Broadway, em Nova Iorque, de novembro de 2004 a março de 2005, quando passou para um na Broadway, onde ficou até maio de 2006. Ganhou os prêmios Pulitzer, de melhor drama, e Tony, de melhor peça.

Nada mais natural, depois de tantos prêmios no teatro, que houvesse uma adaptação para o cinema. O escolhido para dirigi-la foi seu escritor, que tem pouquíssima experiência como diretor, tendo dirigido apenas um filme em sua carreira. Já ganhou um Oscar, pelo roteiro de "Feitiço da Lua". No entanto, cercado de atores do calibre de Meryl Streep e Philip Seymour Hoffman, Shanley se sai muitíssimo bem e realiza um excelente e perturbador filme, que peca em algumas passagens que continuam me parecendo excessivamente teatrais, algumas tomadas e, principalmente, na cena final.

Streep, que pelo papel nesse filme conseguiu sua 15ª indicação ao Oscar (já era recordista, ampliou sua vantagem em 2009), é a irmã Aloysius, diretora de uma escola católica americana em 1964 (data que o filme faz questão de frisar, ao falar que "no ano passado ocorreu o assassinato do Kennedy"). Ela é rigidíssima, conservadora ao extremo. Mantém uma posição de vilã: os alunos têm muito, mas muito medo dela. E Meryl é perfeita em suas feições, olhares e gestos ao transmitir toda essa tirania. Hoffman, também indicado ao Oscar por sua performance, é o padre Flynn, que quer tornar o ensino na escola mais amigável, indo contra as opiniões e os princípios de irmã Aloysius. Para isso, acaba ficando mais próximo das crianças.

Irmã Aloysius, então, decide colocar a irmã James (vivida também magistralmente por Amy Adams, indicada justamente ao Oscar de coadjuvante, por ser a inocência e a angústia em pessoa), a freira mais jovem do colégio, para observar o padre Flynn e qualquer ato que ache estranho. Num dado momento, ocorre uma reunião reservada entre o padre e um garoto da turma de James, Donald Miller, o primeiro negro a estudar neste colégio em todos os tempos. A irmã James comunica o fato à irmã Aloysius, que então assume como verdade absoluta: o padre Flynn cometeu um ato de pedofilia (palavra nunca mencionada no filme). Não adianta o padre contra-argumentar, contar a "sua verdade", convencer a irmã James que ele está certo... Irmã Aloysius continua a persegui-lo.

Não há provas de um lado ou de outro, apenas a palavra, seja dos dois, seja de testemunhas que são duvidosas: alguém que viu o que o padre diz ser verdade, a mãe do garoto (Viola Davis, numa participação breve, mas impressionante, que gerou a quarta indicação ao Oscar 2009 para um membro do elenco do filme) fala alguns dados sobre ele que em vez de elucidar a questão a deixam mais turva ainda...E, no meio, a irmã James com dúvidas: ela fez certo em contar o que viu a irmã Aloysius? Quem fala a verdade: Aloysius ou Flynn?

O filme, com diálogos geniais - tanto pelo texto quanto pela interpretação - entre Streep e Adams, e entre Streep e Hoffman, mais as duas cenas de jantar entre as freiras - impagáveis e tensas, ao mesmo tempo! - mereceria nota 9,5, perdendo 0,5 pois alguns diálogos me soaram muito teatrais ainda. Só que o final é muito ruim, contradiz tudo o que foi visto antes: ao tomar a atitude que toma, irmã Aloysius desconstrói totalmente o histórico da sua personagem, numa tentativa de humanizá-la, aproximá-la do espectador, que até então tinha visto um ser quase irreal na tela. Uma cena desnecessária e comprometedora que quebra todo o "clima" do filme, que poderia terminar com mais dúvidas ainda na cabeça das pessoas, num final bem mais intrigante e pertubador do que esse que temos, o que me fez pensar: "Fiquei até o fim para ver...isso? Era melhor não ter visto, e não sabido que isso tinha acontecido".

Textos #3 - "Um Som de Trovão"

Posted: sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009
Esse post é para todos aqueles que assistiram, em 2004, ao filme "Efeito Borboleta", com Ashton Kutcher e Amy Smart, e não têm a mínima ideia do porquê do título dele. O filme conta a história de um rapaz que tem o "poder" de voltar no tempo, alterar acontecimentos por lá, o que traz consequências para o presente. É um filme bastante bom, ainda mais considerando os envolvidos nele: Kutcher, o protagonista, é um ator bem ruinzinho, e seus diretores e roteiristas, Eric Bress e J. Mackye Gruber são mais conhecidos pelo filme "Premonição 2", que não preciso comentar... Enfim, tinha tudo pra ser mais um filme descartável. Mas, graças ao roteiro engenhoso, às atuações corretas e à boa edição, "Efeito Borboleta" foi um grande sucesso, gerando uma sequência lamentável ("Efeito Borboleta 2", na qual nem atores nem diretores são os mesmos).

No entanto, quase ninguém sabe que o roteiro engenhoso que falei acima surgiu a partir de um conto de Ray Bradbury, "Um Som de Trovão". Bradbury é um dos mais importantes escritores americanos vivos, tendo escritos grandes histórias de ficção científica, entre outros gêneros. Os próprios diretores/roteiristas falam, nos extras do DVD de "Efeito Borboleta", que a inspiração pro filme foi esse conto. Leiam-no até o fim e finalmente entenderão o que quer dizer o tal "efeito borboleta"...!

Para ler o conto na íntegra, cliquem aqui.



Obs: Foi feito um filme baseado no conto "Um Som de Trovão". Mas ele é péssimo...fujam!

"Um Som de Trovão"

Posted:
Um Som de Trovão
Ray Bradbury


O anúncio na parede parecia tremular sob uma película de água quente. Eckels sentiu suas pálpebras estremecerem sobre seu olhar, e o anúncio queimava, na momentânea escuridão:

SAFARIS NO TEMPO, INC.
SAFARIS PARA QUALQUER ANO DO PASSADO
VOCÊ DIZ QUE ANIMAL.
NÓS O LEVAMOS LÁ.
VOCÊ O ABATE.

Uma flegma quente acumulou-se na garganta de Eckels; engoliu e empurrou-a para baixo. Os músculos ao redor de sua boca forma­ram um sorriso enquanto ele estendeu sua mão lentamente pelo ar, e naquela mão, balançava-se um cheque de dez mil dólares, para o ho­mem atrás da escrivaninha.

— Este safári garante que eu volte vivo?

— Não garantimos nada — falou o funcionário — exceto os dinos­sauros. — Voltou-se. — Este é o Sr. Travis, seu Guia, no safári ao pas­sado. Ele vai dizer-lhe o que e aonde atirar. Se ele disser para não ati­rar, não se atira. Se desobedecer às instruções, há uma pesada multa de mais de dez mil dólares, mais um possível processo do governo, quando voltar.

Eckels olhou, através do amplo escritório, numa completa con­fusão disforme, de fios entrelaçados e caixas de aço zumbindo, para uma aurora que agora reluzia laranja, então prateada, e então, azul. Havia um som como uma descomunal pira queimando todo o Tempo, todos os anos e todos os calendários, todas as horas empilhadas e incendiadas.

Um toque da mão e esta queima, instantaneamente, se reverteria lindamente. Eckels lembrou-se literalmente das palavras da propagan­da. De carvões e cinzas, da poeira e das brasas, como salamandras douradas, os velhos tempos, os anos jovens, podem saltar; rosas sua­vizando o ar; cabelo branco enegrecendo-se, rugas desaparecendo; tu­do ,voltando totalmente à origem, fugir à morte, precipitar-se para o começo de tudo, o sol nascendo nos céus ocidentais, e pondo-se glo­riosamente no leste, luas devorando-se a si mesmas no sentido oposto ao costumeiro, e tudo se sobrepondo, como caixas chinesas, coelhos em cartolas, tudo e todos retornando à morte viva, a morte da se­mente, a morte verde, ao tempo de antes do começo. O toque da mão poderia fazê-lo, o mero toque da mão.

— Inacreditável. — Eckels respirava, com a luz da Máquina sobre seu rosto fino. — Uma verdadeira Máquina do Tempo. — Abanou a cabeça. — É de fazer pensar. Se a eleição tivesse ido mal ontem, eu poderia estar agora me afastando dos resultados. Felizmente Keith ganhou. Será um bom presidente para os Estados Unidos.

— Sim — falou o homem por trás da mesa. — Temos sorte. Se Deutscher tivesse ganho, teríamos a pior ditadura. Há sempre um homem anti-tudo, um militarista, um anti-Cristo, anti-humano, anti-intelectual. O povo nos requisitou, sabe, como que brincando, mas a sério. Diziam que se Deutscher se tornasse presidente, queriam vi­ver em 1492. Claro, não é o nosso negócio conduzir Fugas, mas orga­nizar Safáris. De qualquer maneira, Keth é o presidente, agora. Tudo com que precisa preocupar-se agora é...

— Caçar meu dinossauro — Eckels acabou para ele.

— Um Tyranossaurus rex. O Lagarto Tirano, o monstro mais ina­creditável de toda a história. Assine este termo. O que quer que aconteça com você, não somos responsáveis. Esses dinossauros são muito vorazes.

Eckels animou-se, nervoso. — Tentando assustar-me!

— Francamente, sim. Não queremos que vá alguém que entre em pânico ao primeiro tiro. Seis lideres de safári foram mortos no ano passado, e uma dúzia de caçadores. Estamos aqui para dar-lhe a maior emoção que um caçador de verdade jamais almejou. Mandá-lo de volta sessenta milhões de anos, para pegar a maior caça de to­dos os tempos. Seu cheque ainda está aqui. Pode rasgá-lo.

O Sr. Eckels olhou para o cheque. Seus dedos retorceram-se.

— Boa-sorte — falou o homem atrás da escrivaninha. — Sr. Tra­vis, ele é todo seu.
Moveram-se silenciosamente, atravessando a sala, levando suas armas com eles, em direção à Máquina, rumo ao metal prateado e às luzes gritantes.

Primeiro, um dia e então uma noite e então um dia e então uma noite, e então era dia-noite-dia-noite-dia. Uma semana, um mês, um ano. uma década! 2 055 a. D., 2 019 a. D., 1 999! 1 957! Partida! A máquina rugia.

Puseram suas máscaras de oxigênio e testaram os intercomunica­dores.

Eckels inclinou-se no assento estofado, rosto pálido, maxilar enrijecido. Sentia o tremor em seus braços, olhou para baixo e achou suas mãos firmes no novo rifle. Haviam quatro outros homens na Máquinas. Travis, o líder do Safári, seu assistente, Lesperance, e mais dois outros caçadores, Billings e Kramer. Sentavam-se olhando uns para os outros, e os anos ardiam à volta deles.

— Estas armas podem dar conta de um dinossauro? — Eckels sentiu sua boca dizendo.

— Se os acertar direito — disse Travis pelo rádio do capacete. — Alguns dinossauros têm dois cérebros, um na cabeça e outro no fim da espinha. Ficamos longe destes. É abusar da sorte. Atire as duas primeiras vezes nos olhos, se puder, e cegue-os, e volte a atirar no cérebro.

A Máquina bramia. O Tempo era um filme passado ao contrá­rio. Os sóis voavam e dez milhões de luas, atrás deles. — Pense só — disse Eckels. — Todos os caçadores que jamais viveram nos inveja­riam hoje. Isto faz a África parecer com o Illinois.

A Máquina desacelerou; seu grito caiu para um sussurro. A Má­quina parou.

O sol parou no céu.

A névoa que envolvera a Máquina dissipou-se e estavam num tempo antigo, muito antigo mesmo, três caçadores e dois chefes de safári com suas armas metálicas sobre os joelhos.

— Cristo ainda não nasceu — disse Travis. — Moisés ainda não foi à montanha, para falar com Deus. As pirâmides ainda estão na terra, esperando para serem recortadas e montadas.

Lembrem-se disso. Ale­xandre; César; Napoleão; Hitler; nenhum deles existe.

O homem fez que sim.

— Aquilo. — Apontou o Sr. Travis — é a selva de sessenta milhões dois mil e cinqüenta e cinco anos antes do presidente Keith.

Mostrou o caminho de metal que cruzava o verde selvagem, so­bre um amplo pântano, por entre fetos e palmeiras.

E aquele — disse — é o Caminho, colocado por Safáris no Tem­po, para seu uso. Flutua a seis polegadas acima da terra. Não toca se­não no máximo uma grama, flor ou árvore. É um metal antigravitacional. Seu propósito é evitar que vocês toquem, de qualquer manei­ra que seja, este mundo do passado. Fiquem no Caminho. Não saiam dele. Repito. Não saiam. Por qualquer razão que seja! Se caírem, se­rão multados. E não disparem em nenhum animal que não aprove­mos.

— Por quê? — perguntou Eckels.

Sentaram-se, na floresta antiga. Gritos distantes de pássaros vie­ram com o vento, e o cheiro de alcatrão e de um velho oceano salga­do, grama úmida, e flores da cor de sangue.

— Não queremos mudar o Futuro. Não pertencemos ao Passado. O governo não gosta de nós aqui. Temos que pagar muita propina para garantir nossa licença. A Máquina do Tempo é um negócio ex­tremamente delicado. Sem saber, poderíamos matar um animal im­portante, um pequeno pássaro, uma barata; mesmo uma flor, assim destruindo um elo importante, numa espécie em evolução.

— Isso não fica muito claro, — falou Eckels.

— Está bem — continuou Travis, — suponhamos que acidental­mente matemos um rato, aqui. Isso quer dizer que todos as futuras famílias deste rato, em particular, serão destruídas, certo?

— Certo.

— E todas as famílias das famílias, daquele rato! Com um pisão de seu pé, você aniquila primeiro um, então uma dúzia, então mil, um milhão, um bilhão de ratos, possivelmente!

— Então estarão mortos; e daí?

— E daí? — Travis torceu o nariz. — Bem, e as raposas que preci­sariam daqueles ratos para sobreviver? Para cada dez ratos a menos, morre uma raposa. Para cada dez raposas a menos, um leão morre de fome. Para cada leão a menos, insetos, abutres, infinitos bilhões de formas de vida são lançados ao caos e à destruição. Eventualmente, tudo recai no seguinte: cinqüenta e nove milhões de anos depois, um troglodita, um, de uma dúzia no mundo inteiro, vai caçar javalis ou tigres de dentes de sabre para comer. Mas você, amigo, pisou em todos os tigres daquela região. Pisando num só rato. Assim o troglodita morre de fome. E este homem das cavernas, note bem, não é qualquer um dispensável, não senhor! Ele é toda uma nação futura. Dele, teriam saído dez filhos. E destes, mais cem, e assim por diante, até a civilização. Destruindo este único homem, destrói-se uma raça, um povo, toda uma história. É comparável a matar um neto de Adão. O pisão de seu pé, num rato, poderia principiar um terremoto, cujos efeitos poderiam abalar nossa terra e destinos pelo Tempo afo­ra, até seus alicerces. Com a morte daquele troglodita, um bilhão de outros ainda não nascidos são mortos no útero. Talvez Roma nunca se erga sobre suas sete colinas. Talvez a Europa fique para sempre uma floresta espessa, e apenas a Ásia cresça, forte e saudável. Pise num rato e esmagará as Pirâmides. Pise num rato e deixará sua mar­ca, como um Grand Canyon, pela Eternidade. A rainha Elizabete poderá nunca nascer. Washington poderá não cruzar o Delaware, po­derá nunca haver Estados Unidos. Portanto, seja cuidadoso. Fique no caminho. Nunca pise fora!

— Percebo — comentou Eckels. — Então não poderíamos nem tocar a grama?

— Exato. Esmagar certas plantas poderia causar somas infinitesi­mais. Um erro mínimo seria multiplicado por sessenta milhões de anos, desmesuradamente. Claro, talvez nossa teoria esteja errada. Tal­vez o Tempo não possa ser alterado por nós. Ou talvez só possa ser alterado de maneiras sutis. Um rato morto aqui causa um desequilí­brio dos insetos ali, uma desproporção populacional mais tarde, uma colheita má mais adiante, uma depressão, fome, e finalmente uma mudança no temperamento social em países remotos. Algo muito mais sutil, como isso. Talvez algo ainda muito mais sutil. Talvez ape­nas uma respiração, um sussurro, um cabelo, um pólen no ar, uma mudança tão levezinha que se olhasse atentamente, não notaria. Quem sabe? Quem pode dizer que realmente sabe? Não sabemos. Estamos só adivinhando. Mas até que tenhamos certeza, se nossos passeios pelo Tempo podem fazer um barulhão ou um barulhinho na História, seremos cuidadosos.. Esta Máquina, este Caminho, suas rou­pas e corpo, foram esterilizados, como sabem, antes da viagem. Usa­mos estes capacetes de oxigênio de modo que não possamos introdu­zir bactérias nesta atmosfera primitiva.

— Como sabemos que animais abater?

— Estão marcados com tinta vermelha — explicou Travis. — Ho­je, antes da viagem, mandamos Lesperance aqui com a Máquina. Ele veio a esta época em particular e seguiu certos animais.

— Estudando-os?

— Isso — falou Lesperance. — Sigo-os por toda sua vida, obser­vando quais vivem mais. Quantas vezes se acasalam. Poucas vezes. A sua vida é curta. Quando vejo que algum vai morrer com uma árvore caindo em cima dele, ou um que se afoga num poço de alcatrão, ano­to a hora, minuto, e segundos exatos. Disparo um revólver de tinta. Deixa uma marca vermelha em seus flancos. Não podemos nos enga­nar. Então correlaciono com a chegada ao Caminho, de modo que encontremos o monstro a não mais de dois minutos de sua morte, inevitável. Desta forma, matamos apenas animais sem futuro, que nunca vão se acasalar de novo. Vê como somos cuidadosos?

— Mas se esta manhã você voltou no tempo, deve ter cruzado conosco mesmos, nosso safári! Como nos saímos? Tivemos sucesso? Conseguimos voltar todos... vivos?

Travis e Lesperance entreolharam-se.

— Isso seria um paradoxo, — falou este último. — O tempo não permite esse tipo de confusão; um homem encontrando a si mesmo. Quando há o risco de tais situações, o tempo desvia-se. Como um avião passando por um vácuo. Sentiu a Máquina pular antes de pararmos? Éramos nós passando por nós mesmos, a caminho do Futuro. Não vimos nada. Não há meio de dizer se esta expedição teve suces­so; se pegamos nosso monstro, ou se todos nós, isto é, o senhor, Sr. Eckels, saiu vivo.

Eckels sorriu, palidamente.

— Parem com essa conversa — interrompeu Travis. — Todos de pé!

Estavam prontos para deixar a Máquina.

A selva era alta, a selva era larga, e a selva era todo o mundo, pa­ra sempre. Sons como música, e sons como tendas voando, encheram o ar, e eram pterodátilos planando com cavernosas asas cinzentas, morcegos gigantescos de delírio e febre noturna. Eckels, equilibrado no estreito Caminho, apontou seu rifle, bem-humorado.

— Pare! — falou Travis. — Não aponte nem mesmo por brinca­deira, idiota! Se a arma dispara...
Eckels enrubesceu. — Aonde está nosso Tyranossaurus?

Lesperance checou seu relógio de pulso. — Logo à frente. Vamos estar no caminho dele em sessenta segundos. Atenção para a tinta vermelha! Não atire até que eu mande. Fique no caminho. Fique no Caminho!

Moveram-se adiante, pelo vento da manhã.

Estranho — murmurou Eckels. — Lá adiante, daqui a sessenta milhões de anos, fim das eleições. Keith presidente. Todos celebran­do. E aqui estamos, perdidos num milhão de anos, e eles não existem ainda. As coisas que nos preocuparam por meses, por uma vida intei­ra, nem nasceram nem foram idealizadas, ainda.

— Soltar as travas, todos! — ordenou Travis. Você dá o primeiro tiro, Eckels, Billings o segundo, e Kramer o terceiro.

— Já cacei tigre, javali, búfalo, elefante, mas agora, isto é incomparável — disse Eckels. — Estou tremendo como uma criança.

— Ah — fez Travis. Todos pararam.

Travis ergueu a mão. — À frente — falou, em voz baixa. — Na ne­blina. Lá está ele. Ali está Sua Majestade Real, agora.

A selva era ampla, e cheia de gorjeios, farfalhares, murmúrios e suspiros.

Subitamente, tudo cessou, como se alguém tivesse fechado a porta.

Silêncio.
Um som de trovão.

Da neblina, a cem jardas, vinha o Tyranossaurus rex.

— É ele — cochichou Eckels, — é ele... —Psss!

Ele veio sobre grandes pernas, oleosas, resilientes. Erguia-se a trinta pés, acima da metade das árvores, um grande deus do mal, do­brando suas delicadas garras de relojoeiro perto de seu peito oleoso, reptílico. Cada pata inferior era um pistão, mil libras de osso branco, mergulhadas em grossas cordas de músculos, revestidas por um brilho de uma pele pedregosa, como a malha de um terrível guerreiro. Cada coxa, uma tonelada de carne, marfim, e aço trançado. E da grande gaiola arquejante da parte superior do corpo, aqueles dois braços de­licados pendurados para a frente, braços que poderiam erguer e exami­nar os homens como brinquedos, enquanto se dobrava o pescoço de serpente. E a cabeça mesmo, uma tonelada de pedra esculpida, ergui­da com facilidade contra o céu. Sua boca escancarava-se, expondo uma cerca de dentes como dardos. Seus olhos rolavam, ovos de aves­truz, vazios de qualquer expressão, exceto fome. Fechava a boca num sorriso da morte. Corria, seus ossos pélvicos derrubando para os lados árvores e arbustos, seus pés, com garras, afundando-se na terra úmida, deixando marcas de seis polegadas de profundidade aonde quer que apoiasse seu peso. Corria com um passo deslizante de ballet, muito aprumado e equilibrado para suas dez toneladas. Movia-se, cansado, numa arena ensolarada, suas mãos lindamente reptilianas tateando o ar.

— Ora, vejam — Eckels torceu a boca. — Poderia esticar-se e pegar a lua.

— Pssst! — fez Travis, nervoso. — Ele ainda não nos viu.

— Não pode ser morto. — Eckels pronunciou seu veredito, quie­to, como se não pudesse haver discussão. Tinha avaliado a evidência, e era esta sua abalizada opinião. O rifle em sua mão parecia uma ar­ma de brinquedo. — Fomos loucos de ter vindo. Isto é impossível.

— Cale-se! — silvou Travis.

— Pesadelo.

— Dê meia volta — comandou Travis. — Vá em silêncio para a Máquina. Podemos reembolsar-lhe metade de sua passagem.

— Não percebia como seria grande, — falou Eckels. — Avaliei mal, foi isso. E agora, quero desistir.

— Ele nos viu!

Lá está a tinta vermelha em seu peito!

O Lagarto Tirano levantou-se. Sua carne de armadura rebrilhava como mil moedas verdes. As moedas, com uma crosta de lama, fer­viam. No lodo, pequenos insetos esperneavam, de modo que todo o corpo parecia retorcer-se e ondular, mesmo enquanto o monstro não se movia. Expirou. O cheiro de carne crua foi soprado pelos ermos.

— Deixe-me sair daqui — disse Eckels. — Nunca foi como isto, agora. Eu sempre estava certo de que poderia sair vivo. Eu tinha bons guias, bons safáris, e segurança. Desta vez, enganei-me. Encontrei algo que me supera, e reconheço. É demais para eu enfrentar.

— Não corra — falou Lesperance. — Dê a volta. Esconda-se na Máquina.

— Sim, — Eckels parecia entorpecido. Olhou para seus pés, como que tentando fazê-los mover-se. Deu um grunhido, incapaz.

— Eckels!

Deu alguns passos, piscando, hesitante.

— Não por aí!

O Monstro, ao primeiro movimento, impulsionou-se para a fren­te com um grito terrível. Cobriu cem jardas em seis segundos. Os rifles ergueram-se rapidamente e iluminaram-se, com o fogo. Um ven­daval da boca da besta engolfou-os na fedentina do lodo, e sangue envelhecido. O Monstro rugiu, dentes brilhando ao sol.

Eckels, sem olhar para trás, caminhou cegamente para a borda do Caminho, sua arma carregada frouxamente em seus braços, saiu do caminho, e andou, inadvertidamente, pela floresta. Seus pés afun­daram em musgo verde. Suas pernas o carregavam, e ele se sentia só e afastado dos eventos lá atrás.

Os rifles dispararam de novo. O som perdeu-se no grito e no tro­vão do lagarto. O grande volume da cauda do animal lançou-se para cima, e para o lado. Árvores explodiram em nuvens de folhas e ra­mos. O Monstro torceu suas mãos de joalheiro para acariciar os ho­mens, para dobrá-los ao meio, para esmagá-los, como frutinhas, para empurrá-los para seus dentes e sua garganta ruidosa. Seus olhos, quais rochedos, estavam ao nível dos homens. Viram-se espelhados. Dispararam nas pálpebras metálicas e na luminosa íris.

Como um ídolo de pedra, como uma avalanche de montanha, o Tyranossaurus caiu. Trovejando, agarrou árvores, e puxou-as consigo. Agarrou e cortou o Caminho. Os homens precipitaram-se para trás, e para longe. O corpo abateu-se, dez toneladas de carne fria e pedra. Os rifles dispararam. O Monstro brandiu sua cauda blindada, crispou suas mandíbulas de serpente, e imobilizou-se. Uma fonte de sangue jorrava de sua garganta. Em algum lugar lá dentro, um saco de fluido estourou. Borbotões nauseantes inundaram os caçadores. Lá estavam vermelhos, brilhantes.

O trovão dissipou-se.

A selva estava silenciosa. Depois da avalanche, uma paz verde. Depois do pesadelo, o amanhecer.
Billings e Kramer praguejavam pesadamente, com seus rifles ain­da fumegando.
Na Máquina do Tempo, face abatida, Eckels tremia. Tinha con­seguido voltar ao caminho, e subira na Máquina.

Travis chegou, olhou para Eckels, pegou gaze de algodão e, virou-se para os outros, que estavam sentados sobre o Caminho.

— Limpem-se.

Limparam o sangue de seus capacetes. Começaram a resmungar, também. O Monstro jazia ali como uma montanha de carne. Dentro dele, podia-se ouvir os sopros e murmúrios, enquanto seus recessos iam morrendo, os órgãos parando de funcionar, líquidos circulan do um último instante, de saco para a bolsa, para vesícula, tudo des­ligando-se, parando para sempre. Era como ficar perto de uma loco­motiva acidentada, ou uma escavadeira a vapor, no momento de des­ligar, com todas as válvulas sendo desativadas. Ossos estalavam; a tonelagem de sua própria carne, desequilibrada, peso morto, quebrava os delicados braços, do lado de baixo. A carne se assentava aos tre­mores.

Outro estalido. Mais acima, um enorme galho de árvore partiu de sua pesada ancoragem, caiu. Golpeou certeiramente a fera morta.

— Pronto. — Lesperance verificou seu relógio. — Bem na hora. Essa era a grande árvore que deveria cair e matar este animal, origi­nalmente. — Olhou para os dois caçadores. — Querem tirar a foto de troféu?

— Quê?

— Não podemos levar o troféu para o Futuro. O corpo deve fi­car aqui, aonde deveria originalmente morrer, de modo que os inse­tos, pássaros, e bactérias possam devorá-lo, como devem. Tudo equi­librado. O corpo fica. Mas podemos tirar uma fotografia de vocês a seu lado.
Os dois homens fizeram força para pensar, mas desistiram, aba­nando as cabeças.
Deixaram-se guiar ao longo do Caminho de metal. Afundaram cansados, nos assentos da Máquina. Olharam de novo para o Monstro arruinado, o montículo em estagnação, aonde já estranhos pássaros reptilianos e insetos dourados estavam ocupados com a fumegante armadura.

Um som no chão da Máquina do Tempo deixou-os tensos. Eckels estava lá, tremendo.

— Lamento muitíssimo — disse.

— Levante-se! — gritou Travis. Eckels levantou-se.

— Vá para o Caminho sozinho — falou Travis, com seu rifle apontado. Não vai voltar para a Máquina. Vamos deixá-lo aqui!

Lesperance agarrou o braço de Travis. — Espere...

— Fique fora disto! — Travis desvencilhou-se de sua mão. — Este louco quase matou-nos. Mas isso não é tanto assim. Vejam seus sapa­tos! Vejam! Ele saiu do Caminho. Isso nos arruina!

Seremos multa­dos! Milhares de dólares de seguro! Garantimos que ninguém deixa o Caminho, e ele o deixou. Ora, o louco! Terei de informar o Governo. Poderão cancelar nossa licença para viajar. Quem sabe o que ele fez ao Tempo, à História!

— Calma, tudo o que ele fez foi pisar em alguma sujeira.

— Como saber? — gritou Travis. — Não sabemos nada! É um mistério! Saia, Eckels!

Eckels mexeu em sua camisa. — Pago qualquer coisa. Mil dóla­res!

Travis olhou para o talão de cheques de Eckels e cuspiu. — Saia. O Monstro está perto do Caminho. Afunde os braços até os cotove­los na boca dele. Então poderá voltar conosco.

— Isto é irrazoável!

— O Monstro está morto, seu idiota. As balas! As balas não po­dem ser deixadas para trás. Elas não pertencem ao Passado; poderão mudar alguma coisa. Aqui está a minha faca. Cave-as!
A selva estava viva de novo, cheia de antigos tremores e do baru­lho dos pássaros. Eckels voltou-se lentamente para olhar o monte de carniça primordial, aquela montanha de pesadelos e terror. Depois de um longo tempo, como um sonâmbulo, arrastou-se ao longo do Caminho.
Voltou, tremendo, cinco minutos depois, com seus braços enso­pados e vermelhos até os cotovelos. Estendeu as mãos. Cada uma se­gurava algumas balas de aço. Então caiu e ficou lá, imóvel.

— Você não precisava obrigá-lo a isso — comentou Lesperance.

— Não? É cedo ainda para dizer. — Travis tocou o corpo, com o pé. — Viverá. Da próxima vez não vai sair para caçar este tipo de ca­ça. OK. — Ergueu o polegar para Lesperance. — Dê a partida. Vamos para casa.

1492. 1776. 1812.

Limparam suas mãos e faces. Trocaram de roupa. Eckels estava de pé de novo, mudo. Travis olhou para ele por dez minutos.

— Não olhe para mim, — exclamou Eckels. — Não fiz nada.

— Quem pode saber?

— Apenas saí do Caminho, foi tudo, um pouco de lama em meus sapatos; que quer que eu faça? Que me ajoelhe e reze?

— Talvez precisemos disso. Estou lhe avisando, Eckels! Posso matá-lo, ainda. Minha arma está engatilhada.

— Estou inocente. Não fiz nada! 1999. 2000. 2055.

A Máquina parou.

— Saia — ordenou Travis.

A sala lá estava, tal como quando saíram. Mas não exatamente a mesma. O mesmo homem atrás da mesma escrivaninha. Mas o mes­mo homem não parecia estar sentado exatamente atrás da mesma escrivaninha.

Travis olhou em volta, depressa. — Tudo em ordem por aqui? — foi logo perguntando.

— Claro. Bem vindos ao lar!

Travis não relaxou. Parecia estar olhando para os próprios áto­mos do ar, e para o modo pelo qual o sol entrava pela janela alta.

— OK, Eckels, saia. E nunca mais volte. Eckels não podia mover-se.

— Ouviu-me, — falou Travis. — Para o quê está olhando? Eckels ficou, cheirando o ar, e havia algo no ar, uma substância tão tênue, tão sutil, que apenas um fraco aviso de seus sentidos su­bliminares avisavam-lhe que estava ali. As cores, branco, cinza, azul, laranja, na parede, na mobília, no céu, pela janela, eram... eram... E havia uma sensação. Sua carne crispava-se. Ficou bebendo aquela estranheza com os poros de seu corpo. Em algum lugar, alguém devia estar soprando naqueles apitos que só os cães podem ouvir. Seu cor­po gritava silenciosamente, em resposta. Além deste aposento, além desta parede, além deste homem, que não era exatamente o mesmo homem que estava sentado àquela mesa, que não era bem a mesma mesa... estava todo um mundo de ruas e gente. Que espécie de mun­do era agora, não havia como dizer. Ele podia senti-los mover-se ali, além das paredes, quase, como peças de xadrez por um vento quen­te...
Mas a coisa mais imediata era o anúncio pintado na parede do escritório, o mesmo que havia lido hoje ao entrar. De alguma forma, o anúncio havia mudado:

SEFARIS NU TENPO, INC.
SEFARIS PRA QUALQUER ANO PAÇADO.
CÊ DIS QUI ANIMAU.
NÔIS LEVAMOS CÊ LÃ.
CÊOABAT.

Eckels sentiu-se caindo numa cadeira. Ficou mexendo, como louco, na lama em suas botas.

Ergueu um pedaço de algo enlameado, tremendo. — Não, não pode ser, não uma coisinha assim, não!

Embebida na lama, brilhando em verde e dourado e preto, havia uma borboleta, muito bela, e muito morta.

Não uma coisa assim! Não uma borboleta! — gritou Eckels.

Caiu ao chão, uma coisa exótica, pequena, que poderia desman­char equilíbrios e derrubar uma fila de dominós pequenos, e então grandes dominós, e então dominós gigantes, por todos os anos atra­vés do Tempo. A mente de Eckels turbilhonava. Não podia mudar as coisas. Matar uma borboleta não podia ser tão importante! Ou pode­ria?

Seu rosto estava frio. Sua boca hesitava, ao perguntar: — Quem... quem ganhou a eleição presidencial ontem?

O homem atrás da escrivaninha riu-se. — Está brincando? Sabe muito bem. Deutscher, claro! Quem mais? Não aquele maluco pusi­lânime do Keith. Temos um homem de ferro, agora, um homem de peito! — O funcionário parou. — O que há de errado?

Eckels gemeu. Caiu de joelhos. Examinava a borboleta dourada com dedos trêmulos. — Não podemos — implorava ao mundo, a si mesmo, aos funcionários, à Máquina. — Não podemos levá-la de vol­ta, não podemos fazê-la viver de novo? Não podemos recomeçar? Não poderíamos...

Não se moveu. Olhos fechados, esperou, abalado. Ouviu Travis ofegando, na sala; ouviu Travis apontar o rifle, destravá-lo.

Houve um som de trovão.